quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

A Aventura de Aprender a Arquitetar

Prof. Fritz Moura(*)

“Laciate Ogni Speranza, Voi Ch’entrate”, esta foi a frase que encontrei pichada em uma das paredes da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia, onde me graduei em Arquitetura. Certamente todos os estudantes que a freqüentaram a conhece bem, até mesmo a polêmica quanto a sua retirada, fato que ocorrera no final de 1995. Em princípio, não entendi (Latim não é do meu domínio lingüístico), mas logo todos sabiam o significado, corria de boca em boca. A famosa inscrição que Dante leu na porta do inferno tem como tradução: “Vós que entrais, deixai aqui toda a esperança”. A interpretação do significado de tal inscrição na Faculdade de Arquitetura nos permite inúmeras divagações filosóficas, desde a mais óbvia, como a comparação da faculdade com o inferno, até as mais complexas como a comparação entre a passiva posição de aluno do segundo grau e a postura de um universitário.
Após passar pela tortura da escolha da profissão, pelo vestibular, batalhar durante anos em busca do sonho de arquitetar, arquipensar, arquiaprender, arqui-realizar... E depois de tudo isto deparar com tal frase, era no mínimo revoltante. Em princípio preferi ignorar. Com a convivência e as investigações sobre os possíveis significados de tal frase, adicionado a minha vivência universitária, passei a gostar dela, pelo que me fez pensar sobre minha vida de universitário, a universidade em si, o convívio com os meus colegas e a distinção entre mestres e professores. Mas só fui capaz de compreender a dimensão e o significado de toda esta tumultuada investigação de mim mesmo quando li “Tudo que é sólido desmancha no ar”, de Marshall Berman.
Vou então reproduzir um pequeno trecho desse livro, trecho este que considero um resumo da idéia principal, e depois traçar um paralelo entre ele, a frase que abre este artigo e a aventura de aprender a arquitetar.

“Ser moderno é viver uma vida de paradoxo e contradição. É sentir-se fortalecido pelas imensas organizações burocráticas que detém o poder de controlar e freqüentemente destruir comunidades, valores, vidas; e ainda sentir-se compelido a enfrentar essas forças, a lutar para mudar o seu mundo transformando-o em nosso mundo”.
É ser ao mesmo tempo revolucionário e conservador: aberto a novas possibilidades de experiência e aventura, aterrorizado pelo abismo niilista ao qual tantas das aventuras modernas conduzem, na expectativa de criar e conservar algo real, ainda quando tudo em volta se desfaz. Dir-se-ia que para ser inteiramente moderno é preciso ser antimoderno...”
“... São todos movidos, ao mesmo tempo, pelo desejo de mudança – de auto transformação e de transformação do mundo em redor – e pelo terror da desorientação e da desintegração, o terror da vida que se desfaz em pedaços”.

Todos os que, como eu, enfrentaram o vestibular e uma universidade em constante caos, entende muito bem que ao entrar neste turbilhão de acontecimentos devem deixar para trás a esperança de uma convivência tranqüila, principalmente aqueles que realmente se importam em transformar a realidade vivida em algo melhor. A vida é, como diz o texto, uma constante luta para manter “imensas organizações burocráticas” como a universidade e, ao mesmo tempo, lutar para que esta se torne um verdadeiro templo do saber, do investigar cientifico, do florescimento cultural... É importante, para tal, deixar fora de nossos planos a esperança de realizar mudanças, em uma única geração de luta. A aventura de apreender a arquitetar não foi muito diferente desta luta, quando estava seguro de que conhecia tudo, vinha algo novo que desmanchava e me fazia reconstruir novamente.
O fascinante na vida é este constante reconstruir. Estamos sempre tentando segurar a vida, entre nossas mãos, como se sólida ela fosse, e esta se desfaz e escorre entre nossos dedos como água, e novamente enchemos as mãos com outro punhado de vida, e nunca desistimos. Não podemos desistir, pois esta é a essência de nossa existência. Arquitetura é planejar e construir um mundo novo e melhor a cada dia, esquecer preconceitos, ter como referência o regional, mas não o bairro, pois a essência da Arquitetura é universal, e o que realizamos é social, sem deixar de ser pessoal. Ao planejar uma cidade, não estamos realizando a nossa vontade, mas a de uma sociedade, o individualismo pode tornar-se um câncer que há de degenerar esta sociedade. É preciso ter bom senso de usar a boa medida de pessoalidade, universalidade e regionalismo, sem ficar preso a padrões. Agora depararmos com uma nova etapa: a vida profissional, o terror de não poder errar, a responsabilidade acima de tudo. Aquele punhado de vida de que falei anteriormente, com que enchemos as mãos, é, agora, um punhado de vida profissional. Temos a responsabilidade como guia, a ética e a qualidade como objetivo. Não sabemos tudo, mas temos uma vaga noção de nossa ignorância. Não podemos permitir que as ruas de nossas cidades se tornem tediosas com seus edifícios sem vivacidade formando uma paisagem igual e desumana. Enfim, temos que continuar a luta por um viver melhor, pela realização dos sonhos, pela transformação da mentalidade mercadológica que exige a mesma gaiola de concreto de sempre, pelo direito de todos a um lar confortável, por mais simples que seja.

10 comentários:

Franklin Morais Moura disse...

Meu irmão que texto maravilhoso, tenho orgulho de ser seu irmão,pois você é um vencedor. O arquiteto do mundo, nosso Deus, fez para nós um renascer diário quando acordamos devemos repensar, refazer, arquitetar um dia melhor que o outro. Isso não é maravilho, que nós na nossa profissão possamos ajudar a arquitetar um mundo melhor. Que Deus continue abençoando você é o teu lar.

CHIICO MIGUEL disse...

Fritz, meu filho: Li seu artigo "A Aventura..." No que eu conheço, concordo com tudo. No que eu não sei, confio em você. Inteligência plural, inquietude, desejo de muito fazer. E o homem se manifesta pelo que faz e sabe frazer, às vezes até mais que pela fala. O inconsciente nos trai muito. Mas o que digo é de coração, creia e de inteligência, idem: seu artigo é excelente, você caprichou. Abraços do pai e amigo
chico miguel

Anônimo disse...

Se deixássemos apenas a esperança seria bom. Mas, alguns, ainda saem com ela. Infelizmente.

Anônimo disse...

O seu texto é excelente Fritz, você tem o dom da palavra. Já pensou em escrever um livro cunhado? Acho que você veio a esse mundo para algo especial, talvez não saibamos ainda, mas pelo menos podemos ter a certeza que o legado do seu pai continuará, pois você tem criatividade e escreve com o coração e isso são duas qualidades que o bom escritor têm que possuir.

Anônimo disse...

Grande amigo Fritz, sábias palavras, siga adiante com teus sonhos e ideais e que Deus o abençôe grandemente em sua missão durante nossa jornada terrena.

Abraços,

Juliano Bonach

Anônimo disse...

Maravilhoso Texto! Sem palavras. Estou nesta luta, Arquitetar! Universidade, correr atras do meu sonho! E digo; Quero ser vencedora tal como você é! Obrigada pela inspiração e por ter reavivado este sonho que tenho dentro do meu coração!

Unknown disse...

Do acaso eu procurando algo sobre arquitetura para postar para uma amiga, de repente me deparo com esse texto belissimo que escrevestes. Chamei minha esposa ao meu lado e lhe mostrei o que lia; ela tambem ficou fascinada. Parabens Fritz. Devias de realmente pensar na edição de um livro. Um abraço de um paulista apaixonado, e sempre trilhando, pelo caminho do bom escrever.

Unknown disse...

Fritz que saudade amigo ,estou sem contato com vc entra no meu face book para gemte se falar .Grande bj.Adorei o Blog!

Mônica Camardelli

Unknown disse...

Fritz entra no meu face para a gente se conectar de novo,saudades.Mônica Camardelli

Unknown disse...

Fritz entra no meu face para a gente se conectar de novo,saudades.Mônica Camardelli